Zezé era uma das amigas de longa data da minha avó que aparecia na parte da tarde com certa frequência para tomar um cafezinho. Lembro que a Zezé usava um batom vermelho e, por isso, as xícaras ficavam sempre marcadas. Lembro também que ela tinha um olhar intenso, e uma risada característica. Às vezes, ela imitava aquela típica risada de bruxa, e isso me deixava apavorada.
A verdade é que Zezé era envolvente. Ela tinha talento para lidar com crianças. Depois entendi que era professora e, curiosamente, foi ela que pacientemente ajudou na consolidação da aprendizagem da minha mãe que resolveu ler precocemente. Minha mãe, foi uma criança curiosa e esperta, que antes da alfabetização ficava juntando as letras do tabuleiro de palavras cruzadas, o scrabble, dos irmãos. Para atender a criança, minha avó pediu o auxílio de Zezé, mas essa é uma outra história.
Não vou mentir. Não foi o carisma de Zezé que me conquistou de cara, até porque sempre levei mais tempo para me aproximar de alguém. Zezé espertamente me conquistou primeiro pela boca com as empadinhas de queijo fresquinhas que trazia em um grande tupperware. Era o meu presente. Lembro que ela levava especialmente pra mim, pois sabia que iria amar. E, eu, claramente não fazia desfeita ou cerimônia, e tratava de me atracar com as empadinhas. Empadinhas perfeitas, macias e quentinhas.
Confesso que achava a dinâmica das senhoras no café da tarde muito interessante. Fazia questão de participar, na verdade, observar. E queria muito tomar café. O cheiro do café passado sempre foi muito convidativo, mas crianças não tomam café, então eu imaginava, apenas com uma xícara vazia, me enchia de empadas, comia uns biscoitinhos comprados na feira, um bolinho, e ficava lá, olhando aquelas senhoras conversando.
Hoje, amo café. Amo preparar o café. Amo tudo que possa envolver um café da tarde. Amo a proposta de uma pausa para um cafezinho. Sozinha ou acompanhada. Assim como a minha avó, espero receber amigos para um cafezinho da tarde e, quem sabe, comermos as empadinhas de queijo, os biscoitinhos da feira, e um bolinho fresquinho.
🤏🏼 Petit Viajando : Nunca nos conhecemos #12
Inspirada por uma página que sigo há anos no Instagram, comecei a criar histórias para estranhos que foram fotografados por mim de forma aleatória ou consciente nos últimos 10 anos ou mais. Boas fotos, más fotos. Por que não?
Hélio sempre foi da noite. Se pudesse, começaria seus dias quando o sol se põe e dormiria ao amanhecer. Sempre teve dificuldade para dormir cedo e descobriu que suas melhores ideias nasciam no silêncio da madrugada. As coisas começaram a mudar quando conheceu Aurora, sua vizinha, que era definitivamente uma pessoa do dia. Ela acorda cedo todos os dias para caminhar com Caetano, um cachorro da raça Boxer. E não parece se importar, pelo contrário, ela parece amar. Aurora chamou sua atenção quando voltava de uma de suas caminhadas noturnas. Ele, pronto para dormir; ela, pronta para mais um dia. Os olhares se cruzaram, e ela educadamente desejou um bom dia. Essa situação se repetiu algumas vezes, com rápidas trocas gentis. Hélio começou a ansiar pelo “bom dia” de Aurora. Até que, um dia, Aurora acabou convidando Hélio para uma caminhada na praia com Caetano. Eles sentaram na areia, observaram a movimentação ao redor, conversaram, riram, enquanto Caetano se esbaldava. Aos poucos, Hélio começou a entender que as manhãs poderiam ser bonitas e até inspiradoras. O que faltava era encontrar o sentido nas manhãs, assim como Aurora, que diz que a cada nascer do sol é um recomeço. Hélio não deixou a noite por completo, mas está apaixonado pelas manhãs.
Foto: Rio de Janeiro, 2023.
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Novo episódio:
No episódio anterior…
Cativado pelos seus causos e fantasias fotográficas.