Edição #51 - A realidade é uma intuição coletiva
Na edição de hoje: Um texto viajante sobre uma citação em “The Last of Us” e uma nova história em “Nunca nos conhecemos”.
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Bastou uma personagem aleatória soltar a frase “A realidade é uma intuição coletiva” em uma cena da nova temporada de “The Last of Us” para que eu começasse a viajar sobre o assunto. De acordo com a própria personagem, a frase foi dita originalmente pela atriz e comediante Lily Tomlin, a Frankie da série “Grace and Frankie”.
Primeira coisa que pensei foi: UAU.
A frase sugere que a “realidade” é uma construção compartilhada através da intuição. A materialização do que vemos e vivemos seria algo que a nossa consciência cria coletivamente, em consenso.
De acordo com o dicionário, a realidade é o que existe realmente; o que tem existência objetiva, em contraste com o que é imaginário ou fictício; Realidade é o que é real. Claro que estou pensando: o que existe realmente? O que é real? Quem disse que o que achamos que é real é real? Sabe “A Origem”? Enfim…
Intuição é algo difícil de definir. Inclusive, nem sei se consigo elaborar muito sobre intuição porque tenho a sensação de que não tenho uma.
Segundo o dicionário, intuição pode significar:
Conhecimento que, por sua imediatez e clareza, não é precedido de elaboração lógica.
Na filosofia é o conhecimento direto e espontâneo de uma verdade de qualquer natureza.
Na psicologia é a capacidade do indivíduo emitir julgamentos exatos e justos sem justificativa lógica e sem possibilidade de análise.
Na teologia é a visão clara e imediata de Deus.
Ou seja, intuição é algo inexplicável.
Seguindo esse raciocínio, a realidade se faria a partir desse conhecimento espontâneo, sem elaboração, não racional - algo que já está introjetado em nós. A realidade, então, seria uma mistura de tudo e nada. Uma pitada de fenomenologia, com notas de construtivismo social e lascas de física e mecânica quântica.
Nós, enquanto indivíduos, percebemos a realidade, entramos em consenso sobre essa realidade - e é justamente na relação entre o observador e o observado que ela se consolida. Na mecânica quântica (a Interpretação de Copenhague, especificamente), não existe o real antes da observação. É necessário observar para que algo exista - ou para que as partículas se materializem. Seria a realidade uma projeção do pensamento?
É muita loucura? Talvez.
Mas aí, eu lembro que a psicanalista e escritora
diz que a realidade é um alívio.Estamos todos aliviados?
Nunca nos conhecemos #20
Histórias criadas para desconhecidos que fotografei aleatoriamente ou conscientemente nos últimos anos. Boas fotos, más fotos. Por que não?
Francis e Maria ainda não sabem, mas nesse sobe e desce de escadas, em meio a uma infinidade de livros, começa a se construir uma história de amor. Ambas procuram o mesmo título raríssimo "Inventário das Palavras Não Ditas” de Célia von Eiden. Só há um exemplar disponível na loja. Destino ou clichê, as duas o pedem ao mesmo tempo para Tiago, um dos vendedores (e funcionário do mês - mas isso é só uma informação aleatória). Se fosse roteirizado, não seria tão bem amarrado. Sem saber o que fazer, Tiago propõe que elas decidam entre si. A princípio, a situação é constrangedora. Mas, aos poucos, chegam a um acordo: vão dividir o valor do livro e compartilhar a tutela. Maria será a primeira a ler, pois precisa do livro para sua tese de mestrado. Quando terminar, avisará Francis - que buscará o exemplar com ela. Maria acabará por deixar suas anotações nas margens e, de certa forma, Francis terá, de certa forma, acesso aos pensamentos dela, e descobrirá que compartilham não só o mesmo gosto por livros, mas uma sintonia de ideias.
Quando terminar a leitura, Francis convidará Maria para um café. O café que era para durar apenas uma hora, pois Maria tinha um compromisso, durará cinco. As cinco horas se tornarão quatro encontros casuais, um namoro de cinco anos e um casamento de quinze - com dois pets: Jorge, um gato malhado com um narizininho em formato de coração, e Tim, um cachorro rechonchudo que acha que é gente. Pelo menos até agora.
Acontece que venho do futuro. E posso dizer que o segredo desse relacionamento é a habilidade de negociação. E foi assim desde o dia um.